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Entrevista

Luísa Sequeira / TEP

Novembro

2022

Qui
3
Partindo de uma investigação sobre as Novas Cartas Portuguesas, obra escrita por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, Rosas de Maio estreia, entre os dias 11 e 13 de novembro, no palco do Grande Auditório do Teatro Rivoli. Falámos com Luísa Sequeira sobre esta colaboração com o Teatro Experimental do Porto (TEP), que coloca em movimento através do cinema expandido a própria materialidade do arquivo.

Como surge esta colaboração com o Teatro Experimental do Porto (TEP) na senda da investigação que desenvolveste, sobre a obra Novas Cartas Portuguesas e que resultou no teu filme O que podem as palavras, com Luísa Marinho.

Esta colaboração com o TEP surge de uma forma muito orgânica. Nos últimos tempos, tenho colaborado com o TEP: participei na Antígona e no ESTRO / WATTS. Neste último, a fazer cinema expandido e manipulação de imagens em tempo real. O Gonçalo Amorim, diretor do TEP, sabia que eu estava a trabalhar há bastante tempo com as Novas Cartas Portuguesas e convidou-me para fazer uma peça relacionada com o projeto que estava a desenvolver.

Em relação às Novas Cartas Portuguesas, Ana Luísa Amaral refere-se à obra como um “desmantelar [d]as fronteiras entre os géneros narrativo, poético e epistolar, empurrando os limites até pontos de fusão”. Arriscando um paralelismo com a tua peça, na qual diferentes géneros e referências se encontram, de que forma estes se fusionam? Que fronteiras foram diluídas?

Acho que as fronteiras servem para ser atravessadas. E, de certa forma, Rosas de Maio é uma peça que, para além de estar relacionada com as Novas Cartas Portuguesas, está ligada com a minha investigação académica em relação à forma como nos relacionamos com a imagem em movimento. Uma peça que está intimamente ligada à montagem cinematográfica e ao trabalho que desenvolvo com arquivo visual, sonoro, animações. E todo esse material está carregado de significado. Também tenho um interesse especial no arquivo que foi rasurado, esquecido, queimado, deixado na margem e sobre aquilo que nos pode revelar. Rosas de Maio é mais um fragmento dessa cine-constelação. Um espetáculo híbrido, com cinema expandido, que funciona como um lugar de memórias e possibilidades para articular tempos e fragmentos, desconstruindo o continuum da história e oscilando entre o documental e a performance.

Cinquenta anos depois do lançamento de Novas Cartas Portuguesas, numa sociedade ainda vincadamente patriarcal, que força, que leituras e ecos podem ter estes textos? E outros textos de outras mulheres que a História procurou silenciar?

Novas Cartas Portuguesas é um livro com uma enorme riqueza literária, que se abre em múltiplas leituras. A obra está muito atual. Cinquenta anos depois da edição do livro ainda vivemos numa sociedade patriarcal. Existe um retrocesso em muitos assuntos: aborto, os direitos das mulheres, liberdade de expressão, a crise pandémica e económica aumenta as disparidades de género, levando a uma crescente feminização da pobreza. A História não está cristalizada. É necessário olhar para trás e resgatar histórias de inúmeras mulheres, que foram silenciadas e que não estão inscritas na narrativa tradicional.

Para além das palavras de Maria Velho da Costa, Maria Isabel Barreno e Maria Teresa Horta (as “Três Marias”), que outros ditos, e Marias, Marianas, Anas, Luísas, podemos encontrar na peça?

Para além das palavras das três escritoras, podemos encontrar outras vozes que foram de uma enorme importância para a causa das “Três Marias”. Entre elas, podemos ouvir a querida Ana Luísa Amaral, a Marinela Freitas, Gilda Grillo, Natália Correia, Maria de Lourdes Pintasilgo, Simone de Beauvoir, Christiane Rochefort, Marguerite Duras, Ruth Escobar, Adrienne Rich, Virginia Woolf, Rosa Luxemburgo ou Angela Davis. Por um lado, conseguimos ouvir o coletivo que foi tão importante para a causa das “Três Marias”. Por outro lado, através das vozes das intérpretes Carolina Rocha e Mia Tomé, também rememoramos as vozes de mulheres anónimas que foram esquecidas. Numa outra camada, podemos até ouvir o bater do coração da Terra.

© José Caldeira / TMP

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