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Entrevista

Jérôme Bel

Junho

2021

Ter
1

Coreógrafo de The show must go on, apresentado nos dias 3 e 4 de junho, no Teatro Rivoli — uma remontagem com elenco local.

Criado em 2001, o espetáculo The show must go on foi recriado e encenado no mundo inteiro. Esta peça não é sobre si, enquanto coreógrafo, nem sobre a capacidade de criar coreografias complexas, mas antes sobre a apresentação das identidades humanas dos indivíduos que acontecem durante o espetáculo. Desta vez, trabalha com um elenco de bailarinos profissionais e não-profissionais portugueses. O que o atrai no trabalho com não-profissionais, uma vez que é algo recorrente no seu percurso?

Bom, não exclusivamente. Gosto de oscilar entre amadores e profissionais, incluindo referências dentro das suas áreas artísticas como Pichet Klunchin, o bailarino de Khon da Tailância, ou Véronique Doisneau, do Ballet da Opera de Paris. Atualmente, estou a trabalhar como Valérie Drévile, uma atriz francesa com muita experiência. Mas tem razão, não é muito comum juntar, em palco, amadores e profissionais, tal como eu gosto de fazer. É uma questão política: gosto de dar representatividade a corpos normais, a atitudes quotidianas e não apenas à “grandeza” de bailarinos especializados, bonitos e sexy. No caso de The show must go on em particular, a ideia era representar o público em palco. O palco torna-se um espelho do público.

Esta peça consegue provocar o riso no público, mas também abre portas a uma introspeção pessoal. Assim sendo, considera que o público, nesta obra, é um participante tão ativo quanto os intérpretes em palco?

Absolutamente. A peça questiona a Sociedade do Espetáculo, que foi teorizada por Guy Debord. O seu grande tour de force é a tensão entre o entretenimento e a crítica de que é objeto. É uma peça sobre o prazer de ser entretido, ao mesmo tempo que pensa o próprio entretenimento. O público tem muito espaço para se pensar enquanto espectador, sobre o que é o teatro, sobre o que significa ser público, sobre a diferença entre a representação e a vida. É uma experiência muito autorreflexiva. O público não pode apenas consumir esta peça; tem de “trabalhar”, tem de produzir o seu próprio trabalho enquanto espectador.

O elenco recorre a gestos quotidianos para interpretar 19 canções pop. Porquê a música pop? Interessa-lhe que o público esteja familiarizado com as canções e com as letras? Algumas delas podem estar carregadas de memórias ou eventos – é algo que queria explorar?

Queria criar uma espécie de igualdade entre o palco e o público; foi assim que surgiu a ideia de usar música pop. As canções pop famosas pertencem a toda a gente. Independentemente de gostarmos ou não, elas pertencem-nos, conhecemo-las. São parte da cultura globalizada em que vivemos. Mas, como diz, o lado interessante é que, embora globalizadas, são também muito pessoais para alguns de nós. A tensão entre o individuo e a cultura de massas é algo que está em jogo nesta peça.

O que mudou entre 2001 – quando criou a peça – e 2020? Que mudanças externas impactaram a peça?

Há menos problemas. A peça tornou-se muito conhecido e foi apresentada no mundo inteiro nos últimos 20 anos, mas no início as pessoas podiam reagir muito mal durante as apresentações. Tivemos alguns distúrbios em algumas récitas. Agora é considerada uma peça de culto e público está muito mais respeitoso, graças a Deus!


Entrevista realizada a 5 de março de 2020 por Leonor Tudela, responsável pelos Conteúdos do Gabinete de Comunicação do TMP.

© DR

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